O que você faria se encontrasse, na porta de casa, uma caixa com uma galinha preta morta dentro?
Eu, uma pessoa inclusive vegetariana, ficaria horrorizada. Como fiquei. Isso aconteceu na semana passada, mais precisamente na sexta-feira 13. E sim, parece uma novela da Glória Perez, de tão clichê.
Foi assim: sexta-feira é o dia da semana em que eu fico de home office, então não tirei os pés de casa — graças a Deus. Meu marido chegou por volta das 18h e perguntou se eu não havia notado uma movimentação estranha no portão em algum momento. Notei que o cachorro estava latindo durante a tarde, mas é isso mesmo que ele faz, né? Não entendi, portanto, essa manifestação tão natural de um perro como algo estranho.
Aí ele (meu marido, não o cachorro) me contou que havia uma caixa com uma galinha preta morta dentro. Nem tinha sacado ainda a coincidência da data. E não foi como se, por acaso, houvesse uma caixa ali na rua. O portão da nossa casa fica dentro de uma espécie de vão que dá pra rua. A caixa foi colocada ali dentro, nesse vão, em frente ao portão.
Muita tensão. Naquela mesma hora já nos desentendemos, parecia que algo ruim havia começado a se apossar de nós. O fim de semana inteiro foi de angústia. Nem mesmo o show do Gilberto Gil, que rolou no dia seguinte, ajudou a arrefecer a sensação de coisa ruim.
Então fomos a alguns vizinhos que tinham câmeras viradas para a nossa casa pedir que eles dessem uma olhadinha por gentileza. Eu tive vários sentimentos diferentes nesse período, e um deles foi o sentimento mais puro que eu já experimentei: o desejo de vingança.
Eu ia descobrir quem era essa pessoa, eu ia à polícia, eu ia pesquisar a cara dela na internet, eu ia acabar com a vida dela, eu ia perseguir ela na rua, eu ia tacar cocô na casa dela, eu ia simular trabalhos piores no portão dela, eu ia arrumar foto da família dela e colocar num arranjo pavoroso — porém vegano — em cima do muro dela. Eu sou uma pessoa extremamente criativa e obcecada, capaz de passar a noite em claro planejando vinganças bem detalhadas e nunca antes vistas no cinema.
Mas outro sentimento que eu tive foi o cagaço, obviamente. Na verdade, esse foi o mais pungente. E eu fiquei pensando também, por horas e horas, quem poderia querer o meu mal. Repassei a minha vida toda várias vezes pra lembrar de algum mal que eu causei a alguém na vida. E, surpreendentemente, não encontrei nada demais. Umas peripécias na infância, uns amores mal acabados, mas nada que valesse um despacho.
A verdade é que, apesar da minha mente fértil e vingativa, eu sou um doce de pessoa. É sério. Me considero extremamente pacífica. Do tipo que sai correndo em cima de um boi pra não entrar numa briga. Não, péra.
Não caço confusão com ninguém. Nunca. Mas aí pensei no meu marido, que também é de fácil convivência enquanto pedestre. Quando motorista, no entanto, é o satanás. E eu comecei a jurar que era alguém com quem ele brigou no trânsito, anotou a placa do carro, descobriu onde a gente morava e deixou esse presente.
E o fim de semana todo foi essa efervescência de sentimentos, noites pessimamente dormidas e algumas brigas. Até que: no fim do domingo, um vizinho encontrou o momento em questão na câmera de segurança e nos mandou o vídeo. Mas ninguém estava preparado para a verdade dos fatos.
Galinha preta na porta de casa: a verdade dos fatos
Eu confesso que pensei em várias possibilidades para esse momento. Mas nenhuma passou perto de uma série de acontecimentos tão aleatórios que culminaram no ocorrido.
Por volta das 17h, um senhor passeia com o seu doguinho na calçada.
Enquanto isso, uma caminhonete vira em alta velocidade na rua da minha casa.
Uma caixa de papelão que estava na carroceria cai no meio da rua, enquanto a caminhonete segue em alta velocidade.
O senhor, que já estava na esquina, percebe a caixa, volta com seu cachorrinho, pega a caixa no meio da rua, QUASE É ATROPELADO, e volta ao passeio.
Ele abre a caixa, vê do que se trata (uma galinha preta morta, como você já deve ter imaginado), e fecha a caixa novamente.
Não sabe o que fazer e se depara com o nosso portão.
Deposita o objeto ali e segue o passeio com o cachorro.